terça-feira, 16 de junho de 2009

MEMORIAL DA NEGA


MEMORIAL – GESTAR II

Meu nome é Madelaine Gasparini, NEGA é o apelido que carinhosamente recebi desde pequininha. Nasci em Joaçaba, SC, mas fui registrada no município de Herval d’Oeste. Costumo dizer que só nasci aos seis meses de idade quando tive o privilégio de ser adotada por essa FAMÍLIA - que é minha maior razão de existir.
É engraçado como sempre fui apaixonada pelas letras, lembro quando aprendi a ler, lia tudo, tudo, lista telefônicas, rótulos, placas de sinalização, bulas de remédio e, como diz meu pai, era capaz de enxergar até a marca da sola de borracha de um calçado no pé de alguém que estava passando na rua... Nunca fui fã dos números, talvez por essa razão sempre “esqueço” a minha idade, até porque nunca me preocupei com ela, e também por essa mesma razão (de não simpatizar com números!) descobri, após seis meses de namoro, que o meu noivo (futuro marido!) era onze anos mais novo que eu .. ahahahahah ... ADOOOOOROOOO!!!
Estudei durante toda a educação básica, fundamental e médio em escolas públicas – orgulho que carrego no peito toda vez que entro em sala de aula e sinto o carinho e a receptividade dos meus alunos – que certamente – são tão importantes na minha vida quanto o fato de eu estar viva.
Aos doze anos tive uma doença chamada epifisiolise bilateral, a qual me impossibilitou durante muitos anos de caminhar, fiz oito cirurgias e fiquei por quase nove anos me locomovendo através de cadeira de rodas, mas uma das lembranças mais vivas que tenho dessa época é que nunca me importei quanto tempo ainda iria ficar sem caminhar, mas sempre queria saber quando EU PODERIA VOLTAR PARA A ESCOLA !!! Não lembro de lamentar o fato de estar presa a uma cadeira de rodas, mas ficar sem escola era uma tortura para mim.
Desse modo, entre uma cirurgia e outra, perdi minha MÃE, minha verdadeira mãe, a única que eu tive, que não me concebeu, mas me amou com tanta intensidade e me acolheu com tanto carinho em sua vida que jamais alguém poderá sequer imaginar, como ela mesma dizia: esse laço não se explica, apenas se sente profundamente na alma, no coração... com mais essa perda, perdi o rumo, os sonhos, a vontade de viver!
Mas, como tudo na vida não acontece por acaso, meu pai continuou a batalha, e todos os dias me levava para a escola, de cadeira de rodas, mais tarde, de muletas, de andador... enfim, nunca deixei de ir um dia para aquele lugar que tanto me fazia feliz ... a escola, os livros, os professores ... eu amava tudo aquilo ...
Enfim, terminei o ensino médio e pensava em fazer faculdade, mas em Joaçaba, a instituição é privada e eu nunca teria dinheiro para poder cursar. Então, desisti desse sonho quando aos 18 anos tive que colocar próteses nos joelhos e, dessa forma, meu pai gastou o que tinha e o que não tinha para que eu pudesse melhorar um pouquinho minha qualidade de vida, já que eu sentia muitas dores nas pernas e, algumas vezes, não conseguia nem levantar da cama. Passou!!! Tudo passa, Graças a Deus!!!
Aos 22 anos, andando de muletas, uma empresa aceitou me contratar por meio período, assim meu sonho de entrar na faculdade renasceu, afinal eu estava trabalhando e poderia custear parte das minhas despesas. Assim, com quase 23 anos passei no vestibular e entrei no Curso de Letras! Foi o maior orgulho do meu pai e de minhas irmãs ... Chuva, sol, frio, ... nada impedia na minha busca pelo conhecimento... e eu queria mais, muito mais ... Entrei na faculdade de Psicologia, fazia Letras à noite, lecionava à tarde, e ufa, fazia Psico pela manhã. Eu queria viver tudo o que não pude nesses anos em que minhas pernas não puderam me levar... ahahahahahahahah....
Enfim, depois de muitas dificuldades financeiras, bolsas de estudo, pesquisas, terminei Letras e Psicologia e queria mais, mais... passei na seleção do Mestrado em Linguística na UFSC ... o qual foi uma de minhas maiores conquistas ... Chorei, sofri, pensei em desistir ... era muito pra minha cabeça, mas como tudo na minha vida não tem graça se não houver sangue e lágrimas ... escrevi minha dissertação de mestrado nos corredores do Hospital de Beneficência Portuguesa em são Paulo, pois meu pai, minha razão de viver estava em coma, três AVCs, dois meses na UTI... e eu ... firme... não podia desistir naquele momento, não, ele também incentivou meus sonhos ... e como sempre, dei uma rasteira em todas as pedras que insistiam em rolar no meu caminho e defendi minha tese, cujo título obtive com DISTINÇAO E LOUVOR!
Aqui estou, há 16 anos em sala de aula, na ESCOLA DE EDUCAÇÃO BÁSICA PADRE NÓBREGA – de Luzerna – cuja paixão só se compara ao amor que eu tenho por uma outra ESCOLA que também faz meu coração vibrar de emoção quando eu entro na avenida, a minha ESCOLA DE SAMBA UNIDOS DO HERVAL. ...
Minha vida é uma eterna ESCOLA ... eu aprendo e ensino e aprendo e ensino e aprendo e aprendo ... sempre!



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